Este blog tem como objectivo levar a cabo o que indica o título - um passeio pela Matemática. Dar a conhecer a sua História, as suas leis, as suas personagens e curiosidades, enfim divulgar esta Ciência que, como disse Victor Duruy, é a chave de ouro com que podemos abrir todas as ciências.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

"A Matemática trata de ideias"

Entrevista ao Professor Jorge Buescu:


«O autor advoga que “a matemática trata de ideias” e, afirma que historicamente Portugal é “irrelevante” do ponto de vista científico.
Matemática é uma das disciplinas mais difíceis para os estudantes portugueses. Buescu, autor de "A Matemática em Portugal", advoga que a culpa é da Educação. Ou dito de forma, "da debilidade do ensino das ciências em Portugal em comparação com países mais desenvolvidos".
O que é a Matemática e porque é considerada "difícil"?
Ao contrário de convicções generalizadas, a Matemática não trata de números. Economistas, engenheiros ou gestores lidam com números e até podem utilizar ferramentas matemáticas para trabalhar. Mas isto não é fazer Matemática. A Matemática trata de ideias. O trabalho de um matemático é identificar estruturas e padrões e investigar como é que eles se relacionam. Nesse sentido, o processo criativo em Matemático tem muitas semelhanças com as Artes. No entanto, também tem diferenças. E a diferença mais importante é o seu carácter implacavelmente cumulativo, provavelmente mais agudo do que em qualquer outra ciência. Porque é que tantas pessoas afirmam com naturalidade "nunca ter gostado de Matemática"? Muito provavelmente porque, algures no ensino básico ou secundário, deixaram de seguir o fio condutor da exposição matemática nalgum ponto, e a partir daí a exposição passou a nunca mais fazer sentido. Cada aula passou a ser mais uma experiência dolorosa, mais um penoso e inútil sacrifício. Se o leitor nunca sentiu pessoalmente esta angústia, é muito provável que conheça bastantes casos em que ela se verificou.
Porque é que Portugal nunca teve um único matemático de primeira grandeza, da craveira de Newton, Euler ou Gauss?
Portugal é um país historicamente irrelevante do ponto de vista científico. Na Matemática é mesmo, com duas ou três excepções, invisível. Na minha opinião, esta invisibilidade deve-se à permanente mediocridade histórica do ensino das ciências em Portugal em comparação com os países europeus desenvolvidos. Olhando apenas para o ensino mais básico, atente-se nos seguintes números: em 1878, a taxa de analfabetismo é de 80%. É estarrecedor comparar este número com o que se passa na Europa culturalmente avançada: no mesma altura a taxa de analfabetismo na Suécia era de 0,4%, na Alemanha 0,51%, em Inglaterra e na Escócia, 1% na Noruega, 0,08% e na Dinamarca, 0,36%. Como poderiam aparecer grandes matemáticos em Portugal, se o ensino da Matemática, desde o mais básico, sempre foi deficiente? Como poderiam aparecer grandes cientistas em Portugal, se o ensino das Ciências sempre foi deficiente? O contrário é que seria surpreendente.
Os portugueses têm um raciocínio intuitivo? 
Nem mais nem menos intuitivo do que outros povos. De resto, uma compreensão quantitativa, lógica e matemática do mundo é essencial no processo de tomada de decisões, mesmo "intuitivas". Como dizia Pasteur, "a sorte favorece as mentes preparadas". Infelizmente, é minha convicção que não estamos a fornecer às mentes dos nossos jovens a preparação adequada.
O que propõe que seja feito no ensino de Matemática?
Existe um atraso estrutural a recuperar na Educação. Mas não é necessário inventar a roda. Na Matemática grande parte dos problemas impondo exigências de qualidade em quatro ou cinco grandes questões: programas, manuais escolares, avaliações e formação de professores. Sem resolver estas questões não é necessariamente atirando dinheiro para cima dos problemas que progredimos.»

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